top of page
logo mauricio.jpg

Movimentos erráticos dos EUA: o preço de uma política externa de bravatas


Atualmente, os Estados Unidos têm se envolvido em uma série de controvérsias com aliados e elevado o tom contra países que lhes fazem oposição. Nesse contexto, podemos destacar o tarifaço sobre a União Europeia, a China, o Brasil, entre outros.


Mais recentemente, a escalada de tensões comerciais entre Brasil e EUA chama atenção, ainda que setores relevantes de ambos os países reconheçam a pertinência da relação bilateral. Entretanto, outro acontecimento em nossa vizinhança alarma as autoridades brasileiras: em 18 de agosto, os EUA enviaram três navios de guerra, com cerca de 4 mil soldados, em direção à costa venezuelana.


A ação segue os discursos do presidente norte-americano, Donald Trump, que acusa Nicolás Maduro, presidente da Venezuela, de ser uma das maiores lideranças do narcotráfico no mundo. Essa narrativa foi acompanhada pelo aumento da recompensa pela captura de Maduro.


É inegável que o governo venezuelano desrespeita diversos compromissos internacionais e humanitários. Porém, os EUA seguem elegendo seus ditadores favoritos e lançando “caças às bruxas” contra aqueles que lhes convém. Cabe mencionar que até mesmo autoridades brasileiras do Supremo Tribunal Federal (STF), sem qualquer relação com terrorismo ou crime organizado, foram atingidas por medidas unilaterais norte-americanas que os classificam como “criminosos globais”.


Não é a primeira vez que Washington recorre a demonstrações militares concretas para pressionar adversários regionais. Entre 2005 e 2025, os Estados Unidos mantiveram uma presença militar persistente na América do Sul — com exercícios como UNITAS, PANAMAX, Operation Continuing Promise (assistência médica e humanitária móvel), Southern Star (operações especiais), além de eventos como a reativação da 4ª Frota em 2008 e ações simbólicas no Paraguai em 2005 — que incluíam acordos para imunidade de tropas e treinamento próximo à tríplice fronteira do Guarani —, todos interpretados como tentativas de projetar poder e influenciar governos locais. Esse padrão de militarização seletiva e pressões pontuais ilustra que o movimento da semana — com o envio de destróieres à costa venezuelana — é parte de algo muito maior: uma estratégia construída ao longo do tempo, não um evento isolado.


Acompanhamento de Fase
90
Agendar

Ao que tudo indica, Trump não retornará exatamente à política do “grande porrete” (Big Stick), mas reafirma a visão de que “toda a América pertence aos EUA”. Trata-se de uma geopolítica que poderia fazer sentido no tempo das canhoneiras, do colonialismo, do imperialismo e das guerras nacionais, mas que deveria ter sido enterrada junto com os anseios de uma nova guerra mundial.


Donald Trump dobra a aposta global, acreditando que o mundo seguirá os mandos e desmandos de uma política defasada; uma política de uma era em que não havia instituições internacionais consolidadas nem um tecido social global constituído. Hoje, a sociedade internacional não é composta apenas por Estados: a sociedade civil também clama por voz.


Dados recentes indicam que essa política externa mais áspera tem cobrado seu preço em termos de reputação global. Uma pesquisa do Pew Research Center com mais de 28 mil pessoas em 24 países revelou que apenas 34% confiam de fato que o presidente Trump conduza bem os assuntos mundiais — 62% expressaram pouca ou nenhuma confiança — e a imagem dos EUA caiu em 15 dos países pesquisados. Muitos o descrevem como “arrogante” (80%) ou “perigoso” (65%), ainda que também o vejam como um “líder forte” (67%). Paralelamente, pesquisas específicas na América Latina mostram um declínio expressivo da imagem americana — com queda de até 36 pontos no México, 29 no Chile e 23 no Brasil — enquanto a China avança como alternativa de investimento e cooperação, especialmente nos setores de infraestrutura e comércio. Esses indicadores sugerem que os ganhos imediatistas dessas ações coercitivas não compensam a erosão da confiança global e da influência civil–diplomática, que custará caro no médio e longo prazo.


Os interesses das grandes potências já não são as únicas variáveis que definem a política internacional. Há uma complexa rede de atores, recursos de poder e jogos de influência em disputa. Em um primeiro momento, a imposição da força — semelhante às práticas do século XIX — pode render frutos. Contudo, como demonstra a análise acumulada ao longo de anos de estudo das Relações Internacionais, a quebra de confiança que os EUA estão promovendo não compensa ganhos imediatos, pois o planejamento estratégico e os jogos de poder se constroem no tempo. Esse é um ensinamento que a China parece ter compreendido e nos oferece exemplos concretos de como agir de forma paciente e estratégica no sistema internacional.

Comentários


bottom of page